domingo, 7 de dezembro de 2014

Analgésicos podem dar sono na mãe e no bebê além de reduzir a produção de leite.

Analgésicos podem dar sono na mãe e no bebê além de reduzir a produção de leite. Um dos analgésicos mais vendidos no Brasil contém dipirona, prometazina e adifenina. Promove ótima analgesia, mas encerra o risco de causar sono na mãe e no recém-nascido, além de reduzir a secreção do leite que pode impactar no desenvolvimento da criança.

A bula deste produto informa (1):

CONTRAINDICAÇÕES: Durante a gestação e aleitamento. É desaconselhável o seu uso durante a gravidez devido aos riscos de efeitos sobre o sistema cardiovascular fetal, principalmente no terceiro trimestre de gravidez e durante a lactação. Perguntar à paciente se está amamentando. A amamentação deve ser evitada durante e até 48 horas após o uso deste medicamento devido a possível excreção pelo leite materno.

 A prometazina é um anti-histamínico de primeira geração, grupo contraindicado na lactação pelo seu efeito anticolinérgico que inibe a secreção do leite(2,3). Pela sonolência que pode provocar no recém-nascido e pela possibilidade de levar à inibição do reflexo de sucção, pode afetar a nutrição. Por sua vez, a adifenina é um parassimpatolítico, isto é, outro anticolinérgico, usado em espasmos vesicais ou urinários. A bula do produto aponta efeitos anticolinérgicos que reduzem as secreções de modo geral(4) podendo, ainda, potencializar o efeito anticolinérgico de outros fármacos. A bula também informa que o aleitamento deve ser interrompido no dia que a mãe faz uso e mais 48 horas. Interromper o aleitamento não é um ato simples e precisa ser muito bem ponderado. Existem diversos outros analgésicos com melhor relação entre risco e benefício que podem ser administrados a mãe.

São maiores os efeitos adversos deste analgésico composto quando a lactante recebe o produto sistematicamente, a saber, a cada seis ou oito horas, prática comum (usa-se o termo “protocolo”) em muitas maternidades de são Paulo. A Organização Mundial da Saúde considera este medicamento compatível com a amamentação se dado em doses únicas, alertando para evitar as prescrições de horário, além de monitoramento do bebê quanto à ocorrência de sonolência excessiva(5) e outros efeitos adversos.
No comércio, existe outro analgésico composto que contém codeína, (substância parente da morfina) totalmente contraindicado para mães lactantes e também prescrito de forma indevida para este grupo.


Referências bibliográficas:

1)Bulário Eletrônico da ANVISA: http://www.anvisa.gov.br/datavisa/fila_bula/frmResultado.asp#. Acesso em  11/11/2014.

2)Skidgel RA, Erdos EG. Histamina, bradicinina e seus antagonistas. Capítulo 24 do livro “Goodman & Gilman – As bases farmacológicas da terapêutica” de Brunton LL, Lazo JS, Parker KL. 11ª edição McGraw-Hill Artmed. São Paulo, 2010. Pgs. 563-84.

3)Kastrup EK (editor). Drug – Facts and comparisons. JB Lippincott Philadelphia. 1982 ed. Pg 627.

4)Guidechem Chemical Trading Guide. Disponível em <http://www.guidechem.com/reference/dic-340.html>. Acesso em 04/04/2014.

5)Anon: Breastfeeding and Maternal Medication. World Health Organization, Geneva, Switzerland, 1995.

Este texto foi parcialmente publicado no mais recente BOLETIM DE FARMACOVIGILÂNCIA do Centro de Vigilância Sanitária da S. Saude de S.P. Acesse http://www.cvs.saude.sp.gov.br/zip/BOL_4_%20layout_%20final_corrigido.pdf

NB: ajude a divulgar, principalmente para obstetras.

domingo, 18 de maio de 2014

Sal de cozinha pode ser salvação ou arma mortal

O sal de cozinha, cloreto de sódio, administrado por via oral ou intravenosa, pode ser a salvação de crianças ou adultos que estejam sofrendo desidratação. Mas, na dose errada, o mesmo sal pode ser mortal. Na Índia, há pouco tempo, houve dois casos em que um produto farmacêutico que continha uma quantidade de sal para ser diluída em 1 litro de água, foi dissolvida, por engano, em apenas um copo.

As duas crianças vítimas das falhas, passaram muito mal e uma delas veio a falecer. Há alguns anos, nos Estados Unidos, uma mãe perturbada dava sal às escondidas e quase matou uma criança de um mês de idade que estava internada devido à diarreia intensa. Estes dois exemplos ilustram bem que a diferença entre um medicamento e um veneno está na dose. A toxina produzida pelo bacilo do botulismo é tão forte que um feijão contaminado tem força para matar dezenas de pessoas.

Em dose e localização corretas, a mesma toxina é o botox, que embeleza milhares de homens e mulheres. Os sais de ferro corrigem a anemia carencial mas são muito irritantes para o estômago e já houve casos de gastrite aguda fatal em crianças pelo exagero da dose. Por isso, a administração de sulfato ferroso ou outro medicamento contendo ferro, geralmente é feita em doses progressivas, que dão tempo para o aparelho digestivo se adaptar a esta forma de tratamento.

domingo, 11 de maio de 2014

REFRIGERANTES E SUCOS ARTIFICIAIS NA CAUSA DO EXCESSO DE PESO.

REFRIGERANTES E SUCOS ARTIFICIAIS NA CAUSA DO EXCESSO DE PESO.
Aumento do peso documentado em crianças de todas as regiões brasileiras

O percentual de crianças com peso excessivo vem crescendo em todas as regiões do país. Pesquisas envolvendo milhares de crianças com idades entre 2 e 5 anos mostraram que índices de excesso de peso aumentaram, em valores médios, de 3% em 1989, para 3,4% em 1996 e 7,8% em 2006. Em termos regionais, os maiores aumentos ocorreram no sul (de 3,4% a 7,8%) e no norte (de 1,6% a 7,2%). Os dados se baseiam numa pesquisa realizada por investigadores da Universidade Federal de São Paulo e da Universidade Federal de Juiz de Fora, publicada recentemente. Um dos fatores associados ao aumento de peso foi o consumo de refrigerantes e sucos artificiais mais de 4 vezes por semana. Obesidade e o sobrepeso não são apenas problemas estéticos; suas repercussões na saúde podem ser graves e ainda piores quando os desvios no peso se instalam precocemente na vida. Os pesquisadores destacam que o aumento na incidência do excesso de peso em nosso país coincide com mudanças econômicas e políticas como o fim da ditadura militar, consolidação da democracia, controle da inflação e estabilização econômica. Elas levaram a modificações no estilo de vida e nos hábitos alimentares de todas as faixas etárias mas principalmente dos pré-escolares que sofrem mais influência da propaganda nos meios de divulgação, em especial, da televisão. Uma parte da explicação para os maus hábitos alimentares se encontra nas pessoas que tiveram carências alimentares com seus resultados negativos no passado e tendem ao equívoco de valorizar o excesso de peso, sem se dar conta de suas sérias consequências na saúde e no conforto pessoal.
Fonte:

Silveira, Jonas Augusto C, Fernando Antônio B. Colugnati, Monize Cocetti, José Augusto A.C. Taddei. Secular trends and factors associated with overweight among Brazilian preschool children: PNSN-1989, PNDS-1996, and 2006/07. Pediatr (Rio J). 2014;90:258-66. Visite artigo <http://jped.elsevier.es/en/secular-trends-and-factors-associated/articulo/90304523/>

segunda-feira, 21 de abril de 2014

Vitamina C tem riscos e não previne gripe nem resfriados

Chance de efeitos indesejáveis graves é maior se já existe calculose urinária

Muita gente bem nutrida que não precisa de qualquer suplemento alimentar toma doses diárias de vitamina C pois acredita que, “se não fizer bem, não pode fazer mal”. Parece uma forma simples de prevenir gripes e resfriados. É um duplo engano. Nenhum estudo sério mostrou esta capacidade de proteção. Além disso, o uso sem controle do ácido ascórbico (que é o outro nome desta vitamina) aumenta o risco de problemas renais em certas pessoas predispostas. O metabolismo destas pessoas apresenta uma falha hereditária que favorece a eliminação exagerada de sais chamados oxalatos que resultam na formação de cálculos que lesam rins e vias urinárias.

A vitamina C aumenta claramente este risco. No uso prolongado, até pessoas normais podem ter excesso de oxalatos na urina e podem sofrer as consequências.  Basta ler a bula dos produtos que tem a citada vitamina. Mas é preciso atenção às informações pois as palavras e expressões usadas nas bulas nem sempre são muito claras. Quanto mais focalizamos os diversos estudos científicos relacionados a estes problemas ficamos mais convencidos do risco do uso diário de ácido ascórbico. Até pessoas sem antecedentes familiares de calculose podem ter excesso de oxalato na urina. Um relato recente confirma, mais uma vez, aquilo que já se sabia sobre o problema. Uma mulher de 33 anos apresentava insuficiência renal crônica de origem não esclarecida.

Como não havia antecedentes de calculose urinária, não se fez a dosagem de oxalato no sangue nem na urina. Ele faz transplante renal com rim doado por um familiar compatível. De inicio, houve sucesso aparente mas logo o rim passou a falhar. A biopsia mostrou lesão dos túbulos renais por excesso de oxalato. Biopsia da medula óssea mostrou que neste tecido havia depósito de oxalato. Nesta ocasião, ela informou que vinha tomando diariamente 2g de vitamina C por muitos anos. Foram infrutíferas as tentativas médicas de sanar os distúrbios e a paciente voltou à insuficiência renal e à necessidade de hemodiálise.  

Fonte: Yaich S et al. Secondary oxalosis due to excess vitamin C intake: a cause of graft loss in a renal transplant recipient. Saudi J Kidney Dis Transpl  2014 Jan;25(1):113-6.

sábado, 29 de março de 2014

Semelhanças perigosas: que acontece para quem não liga para a bula?  



Em 2005, o Serviço de Saúde Pública dos Estados Unidos foi informado de um equívoco no tratamento de pacientes que eram atendidos em uma clínica gratuita para gays e lésbicas de Nova Iorque. Durante o período de 1999 a 2004, pacientes com diagnóstico de sífilis tinham recebido uma medicamento composto de dois tipos de penicilina: do tipo benzatina e do tipo procaína em partes iguais. Na verdade, o que se recomenda, para esta doença é o dobro da dose da penicilina benzatina que havia no produto dispensado, sem a presença da penicilina procaína. Os dois produtos se pareciam muito. O nome comercial do produto indicado é Bicillin A-P . Um fato chocante é que a bula do produto administrado (Bicillin C-R) dizia que ele não era indicado para tratar sífilis mas sim para pneumonias e infecções de garganta. Demorou cinco anos para alguém ler a bula e dar o alarme. A falta de percepção do erro foi facilitada porque a soma das duas formas de penicilina tinha ação razoável sobre a doença, curando muitas pessoas. No entanto, alguns casos evoluíram para consequências neurológicas gravíssimas. Esta evolução é lenta, não causou alarme na equipe da saúde pois as complicações também podem ocorrer, em menor número, quando se instala o tratamento ideal, com a penicilina benzatina na dose correta. Após este episódio muito doloroso, envolvendo quase 500 pessoas atendidas, os produtores, em colaboração com as autoridades da saúde, fizeram mudanças na apresentação dos produtos no sentido de facilitar a diferenciação. Os conhecimentos adquiridos sobre os medicamentos depois que eles entram no mercado fazem parte da chamada “farmacovigilância”. Certas reações indesejáveis sérias, porém mais raras, só são detectadas após a aprovação da venda e consumo pela população. Por exemplo, uma primeira vacina contra o rotavírus em raras crianças causava a intussuscepção intestinal, que é uma espécie de inchaço e entupimento dos intestinos, e foi retirada do mercado nos Estados Unidos. 

sábado, 1 de março de 2014

Criança quase em coma: grande susto

Criança em coma nem sempre é caso grave

Anos atrás, eu trabalhava muito em Pronto Socorro Infantil. Quase no final de um plantão, chegou uma criança de 5 anos, praticamente em coma. A família tinha deixado a criança por algumas horas com a empregada, mas esta estava muito ocupada nos quartos da residência. Ao retornarem à casa encontraram a criança “dormindo” muito, na sala. Era uma criança normal até este episódio. Quando procurei cheirar o hálito do pequeno, a mãe me disse que tinha esfregado álcool no rosto numa tentativa de acordar o menino.

Um dos familiares usava medicamento sedativo diariamente, mas garantiram que a caixa não fora tocada. Logo pedi exames e prescrevi soro glicosado endovenoso. O colega que assumiu o plantão teve o prazer de ver a criança melhorar rapidamente. Após confabulações entre os familiares, eles informaram que encontraram um frasco de licor “escondido” atrás de um brinquedo grande, com nível diminuído. Uma das pessoas da família ingeria diariamente algumas doses desta bebida. Na verdade, o caso era um quase coma alcoólico e o menino se recuperou totalmente. É provável que a família já sabia da ingestão da bebida mas, de inicio, procurou esconder, talvez pensando em não expor o parente etilista. Em algumas condições, o médico precisa ter “desconfiômetro” aguçado e buscar dados que a família prefere esconder, por exemplo, nas casos de violência contra a criança mas este será outro post.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Um cão fofo pode prejudicar uma criança?

Minha cliente trouxe o filho de 6 anos ao consultório informando dor de barriga e febre com 4 dias de duração. Dois dias antes da consulta, o menino foi levado  ao serviço de urgência onde foi examinado e submetido a radiografia simples de abdome em pé e deitado, com resultados normais. Com suspeita de virose, recebeu medicação sintomática.

Como não houve melhora, veio ao meu consultório.  A dor se localizava próxima ao umbigo, sem irradiação, pouco definida e não impedia a atividade da criança. O estado geral era muito bom, com boa disposição geral. Ao exame físico, nada havia de importância, inclusive na palpação abdominal. Também suspeitei de alguma virose que se curaria sem medicação. Sugeri somente analgésicos. A família voltou ao consultório no dia seguinte, sem melhora do quadro.

Neste atendimento, perguntei especificamente sobre alguma situação de estresse psicológico e a mãe negou. Solicitei diversos exames mas, uma hora depois da consulta a mãe telefonou porque se lembrou que a cão da família tinha sido operado recentemente e todos estavam muito preocupados porque ele não deveria brincar nos primeiros dias após a cirurgia, sob risco de se complicar o problema. O menor gostava muito do animal e tinha dito à mãe que o contato com o  cachorro lhe provocava “um frio na barriga”.  Perante esta nova informação,  orientei a mãe para que conversasse com o filho, explicando que o cão já estava melhor e  que logo poderia brincar. Suspendi exames. Após esta conduta, os sintomas desapareceram  totalmente. 

Revendo dados do menor, constatei que, um ano antes, ele já tinha apresentado um episódio em que as fezes escapavam e sujavam a cueca, numa ocasião em o menor tinha conflito entre ficar na sala para se alimentar ou descer ao pátio e brincar com os amigos. Posteriormente teve uma fase de incontinência urinária sem motivo aparente, durante poucos dias e que regrediu totalmente sem medicação. Orientei para ludoterapia que está em curso.     

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Evacuação vermelha, era sangue?

No dia 10/01/2014, pela manhã, me ligou mãe de LCM, criança de 2 anos e 4 meses, informando que o menor apresentava diarreia líquida, sem cheiro, sem muco ou sangue, sem cólica nem febre. Não havia problema semelhante na família nem outros dados interessantes. Orientei o tipo de alimentação e prescrevi uso de um soro oral comercial, a vontade. A noite do mesmo dia mãe tornou a ligar, muito preocupada e informou que a criança estava evacuando “puro sangue”, na expressão dela. Tinha fotografado a fralda e se ofereceu para enviar foto por email, o que aceitei. Como não havia outras manifestações  importantes suspeitei que ela tivesse ingerido alimentos com corantes que poderiam explicar a queixa. De fato, o soro sabor morango que a criança tinha usado apresenta a cor que aparecia nas fezes. A interrupção do uso deste produto realmente eliminou o sintoma.